sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Ausência






Eu deixarei que morra em mim o


desejo de amar os teus olhos que são doces


Porque nada te poderei dar senão a mágoa


de me veres eternamente exausto.


No entanto a tua presença é


qualquer coisa como a luz e a vida


E eu sinto que em meu gesto existe o


teu gesto e em minha voz a tua voz.


Não te quero ter porque em


meu ser tudo estaria terminado,


Quero só que surjas em mim


como a fé nos desesperados


Para que eu possa levar uma gota de


orvalho nesta terra amaldiçoada


Que ficou sobre a minha


carne como nódoa do passado.


Eu deixarei... tu irás e encostarás


a tua face em outra face.


Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu


desabrocharás para a madrugada.


Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,


porque eu fui o grande íntimo da noite,


Porque eu encostei minha face na face da noite


e ouvi a tua fala amorosa.


Porque meus dedos enlaçaram os dedos da


névoa suspensos no espaço.


E eu trouxe até mim a misteriosa essência do


teu abandono desordenado.


Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.


Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.


E todas as lamentações do mar, do vento, do céu,


das aves, das estrelas. Serão a tua voz presente,


a tua voz ausente, a tua voz serenizada.



Vinícius de Moraes

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